Saturday, April 30, 2005

Poema Doce

Doce menina sapeca,
Doce é teu nome,
Menina levada,
Doce de goiaba,
Doce lembrança
Dos tempos de infância
Soltos nas ruas,
Nos quintais suburbanos
Da casa de minha avó.

Doce é teu nome,
Agora mulher,
Mas com um sorriso maroto
No canto da boca.
Riso de menina
Que corre descalça,
Que brinca na rua,
Toma banho de rio
E rouba frutas diversas
Dos quintais alheios.

Doce é teu nome,
Levado, o sorriso,
Doce é a vida,
Vivo é o rio.

Saturday, April 23, 2005

Cortes

Eu sou um aleijado
Asas, faltam-me asas
Alma, falta-me a alma

Eu sou um mutilado
Falta-me o sorriso de criança
Estirpado por algum bisturi

Eu ando apoiado em muletas
E tomo quilos de neosaldina
Pra aliviar a dor

Eu vivo como quem perdeu o coração
Ou, pelo menos, seus batimentos mais simples

Como quem faz hemodiálise
De lembranças...

Eu sou um aleijado
Sonhos, faltam-me os sonhos.

Saturday, April 16, 2005

A Torquato Neto

São três da madrugada
E meu coração vazio não vale, nunca valeu, nem
Nunca valerá nada

São três da madrugada, Torquato
E eu choro que nem uma boneca vagabunda,
Implorando um pouco de paz...
Um pouco de gás...

São três da madrugada
E ela nunca tomou nota
Do amor que guardei só pra ela
E que secou feito leite estragado

São três da madrugada, bicho
Eu já andei pra caralho
E tô tão cansado
Que cortaria um braço
Pra me sentir mais leve

São três da madrugada, Torquato
E eu rezo a você
Uma reza louca,
Descabelado, desgrenhado,
Babando sangue pelo canto da boca

São três da madrugada
Pobres de nós, Torquato

Saturday, April 09, 2005

La Vie En Rose

Meu deus, onde foi que deixei minha vida?
Parece ter sumido com meus brinquedos
Através do buraco negro por onde foi minha infância...
Talvez tenha escorrido dos meus olhos,
Rolado pelo meu rosto
E encharcado a fronha,
Junto com lágrimas de raiva da pré-adolescência...
Nas casas dos amigos
Cobertos pela poeira do tempo?

Onde foi que me perdi de mim?
Nos banheiros, desesperado, tentando me recompor
Para retornar à mesa e aos amigos?
Nas pontas atiradas pelas janelas
Dos carros nas estradas?
Nos copos de vodca?
No sexo? Nas drogas? No rock'n'roll?

Quando foi exatamente que minha vida se obscureceu?
Depois de que reunião? Em que aparelho?
Depois de qual beijo?
Em que sessão de psicanálise
Exorcizando amores fracassados?
Em que medo sentido?

Quando, diabos, deixei de existir
Para tornar-me esfinge de mim mesmo
E devorar-me
Autofagicamente?

Saturday, April 02, 2005

Remendos do Dia

Queria devolver tua alma
E fingir que nada de teu ficou em mim
Nem esse cansaço de me saber covarde
Nem essa dor de me fazer algoz

Queria devolver tua alegria
E fugir, que nada de meu ficou em ti
Nem esses olhos que te sabem frágil
Nem essas asas que te cortam a carne

Mas o mundo me chama
E o mal está feito...
E nem mil remendos
Consertariam o dia estilhaçado